Será que é possível juntar arte às paisagens? E máquinas e animais? Será que pode haver dança num museu? Né Barros mostra que sim com a sua peça “IO: Paisagens, Máquinas, Animais”.
IO: Paisagens, Máquinas e Animais | Foto: Fernanda de Lima/Porto Cultural
No final da manhã do dia 19 de novembro de 2023, no Museu Nacional Soares dos Reis, na Sala de Escultura, com paredes claras e esculturas de tons brancos e pretos em toda a volta, havia apenas um triângulo cor de laranja no chão. A sala ainda se encontrava vazia, mas não tardou muito para encher. Os dois bailarinos chegaram e o espetáculo começou. O som começou baixo, mas foi aumentando tal como os movimentos lentos dos intérpretes.
Né Barros é responsável pela direção e coreografia da peça de ballet “IO: Paisagens, Máquinas, Animais”, cria, assim, uma narrativa onde envolve elementos musicais, mitológicos e científicos. Diz-nos que este nome tem a ver com a mitologia e também com o nome da peça musical da encenação, remete-nos “a uma figura mítica de um corpo meio Deus, meio extra-natural e meio animal. E isto interessava-me reportar um pouco este lado mais ancestral para o corpo dançante. Mas o importante também é o próprio subtítulo, que é "Paisagens, Máquinas e Animais””.
Esta é a primeira de uma série de trabalhos de Né Barros num conjunto de três peças (IO, Neve e Distante) que se movem entre paisagens, máquinas e animais. “Estas três peças funcionam como um tríptico que dialoga entre si e que vai encontrando diferentes formas de pensar o corpo. Neste caso era mais o corpo animal, o corpo primitivo. Na segunda peça é o corpo paisagem e no terceiro é o corpo máquina. Daí Paisagens, Máquinas e Animais. Portanto, estas três dimensões serviram de mote para a criação de três peças que, no seu conjunto, fazem esta ligação de como nós podemos entender o corpo”, explica a coreógrafa que conforme fala nota-se o seu orgulho por estes trabalhos.
IO: Paisagens, Máquinas e Animais | Foto: Fernanda de Lima/Porto Cultural
Entender o corpo através da dança
Enquanto se observa cada movimento dos bailarinos, Beatriz Valentim e Bruno Senune, sente-se também todas as emoções que estes transmitem. Numa onda de sentimentos, fica a questão “ qual é a mensagem deste espetáculo?”.
A peça convida o espectador a parar e a observar as diferentes possibilidades de abrir novos sentidos sobre o próprio corpo, seja “o nosso corpo mais instintivo, mais primitivo e a forma como nós nos relacionamos”. Acaba por ser também uma forma “de entender o corpo para além da sua funcionalidade mais mundana, mais cotidiana”.
Né Barros continua a desafiar os limites da expressão artística, fazendo com que esta peça permaneça como testemunho do poder da criatividade interdisciplinar, convidando os espectadores a embarcar numa exploração da experiência humana e numa melhor compreensão do outro.
A dança tem um forte poder na comunidade, trazendo assim uma mensagem de “devolver mais humanidade”, a diretora artística acredita que “funciona quase como um espelho de nós próprios. E ao revermos através do gesto expressivo, simbólico e artístico, permite-nos criar uma dimensão ética com o outro. E é isso que o mundo precisa neste momento. É olharmos o outro”.
Uma música inspirada na Lua
A sinfonia única que se faz ouvir ao longo da performance tem como instrumento, o saxofone, dominado por Henrique Portovedo e a mesa de som regida por José Alberto Gomes. A música, composta exclusivamente para este espetáculo, traz consigo sensações que só quem assiste sente. José Alberto Gomes é o compositor da canção, também chamada “IO”, diz que esta melodia “é uma referência à lua”, pois este também é o nome de uma das quatro grandes luas de Júpiter que, apesar de estar localizada numa região gélida, caracteriza-se por ser o local com maior atividade vulcânica do Sistema Solar. Sendo assim, a lua é “uma referência a este ambiente que temos distante, estéreo, mas também com muita atividade”, deste modo o som transmite sensações que nos fazem sentir num ambiente espacial.
Museu Nacional Soares dos Reis como palco de dança
O ritmo da música vai aumentando, o respirar dos bailarinos faz-se sentir na sala, juntamente com o silêncio de quem assiste ao espetáculo. Uma das espectadoras é Teresa Brito, que se mostra bastante satisfeita com o que acaba de ver. O Museu Nacional Soares dos Reis serviu de palco para este espetáculo cheio de criatividade e emoções. A espectadora manifesta o seu agrado com esta iniciativa, afirmando que estas fazem fomentar a cultura no Porto e que é uma forma de as pessoas “começarem a conhecer ou tomarem contato com a dança”. Acredita que esta é uma forma de valorizar a dança e de demonstrar que na cultura há espaço para esta arte. E, por fim, diz-nos que “a cultura é essencial para sempre na sociedade”.
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