Quem caminha pelas ruas do Porto, não imagina que a meio da Rua Guerra de Junqueiro se situa a maior Sinagoga da Península Ibérica, a Sinagoga Kadoorie - Mekor Haim. Dentro da sinagoga existe o Coro Mekor Haim, fundado em outubro de 2020 com o objetivo de “ensinar e executar música litúrgica judaica, sefardita e hebraica, para a educação e fruição dos seus membros e da comunidade em geral".
Coro Mekor Haim (Fonte de Vida) | Imagem: Fernanda Lima
Yonah Yaphe tem 68 anos e juntamente com o seu amigo Luciano Moura decidiu criar o coro. A ideia surgiu por parte de Yonah, que já tinha sido membro de alguns coros, inclusive, alguns coros, em Israel e também cantava noutro coro no Porto. A vontade de criar agora um coro na sinagoga era muita, diz que sempre que se sentava na Sinagoga, a orar, a cantar e por vezes quando falava com o amigo Luciano, sentia que precisavam de fazer um coro ali.
O fundador do Coro Mekor Haim afirma que “a ideia começou mais no ano da pandemia, quando a atividade do outro coro parou e o filho do Luciano encontrou o maestro Leonardo na Universidade do Porto. E daí foi uma junção de coisas”. A vontade era tanta, que estes três membros integrantes do coro, no dia 27 de outubro, já se encontravam sentados na sala de casa de Leonardo, ao lado do piano, e começaram a cantar. Desde então, o coro começou a crescer. Leonardo Mendonça é o maestro do atual coro da sinagoga do Porto, licenciado em canto lírico pela Universidade do Estado de Minas Gerais, no Brasil, é preparador vocal, diretor musical e compositor premiado de diversos trabalhos.
Yonah Yaphe, Luciano Moura e Leonardo Mendonça | Imagem: Fernanda Lima
Atualmente, o grupo conta com 13 elementos de vários locais: do Canadá, de Lisboa, Brasil, Israel, mas são na sua maioria da área do Porto. Para fazer parte deste conjunto não há restrições de idade, sendo que as idades vão desde os 20 aos 73 anos.
Yonah Yaphe diz que “o limite não existe, porque também não há limite na religião, as pessoas que são judias, quando se interessam na música, na música dos judeus, aprendem, atuam e trabalham”. Luciano Moura acrescenta que o coro “é um convite aberto, não só da comunidade, mas também da comunidade exterior”.
O coro acaba por ser uma forma de juntar a comunidade Judaica do Porto e não só, pois “nós temos o hábito de a cada última sexta-feira do mês à tarde cantar para grupos de alunos ou turistas que visitam o museu”. O museu a que Yonah se refere é o Museu do Holocausto no Porto, situado perto da sinagoga, e considera-o como a principal casa da comunidade judaica do Porto.
O Coro Mekor Haim realça a cultura musical a turistas e à população, que a recebe com entusiasmo. “As pessoas reagem com muita simpatia, há muitas pessoas que não conhecem música judaica e música litúrgica. Reagem com surpresa até mesmo pessoas da sinagoga, porque esta música tem a mistura de canções em hebraico, canções em ladino, judeu e espanhol. E o material do coro reflete a diversidade da comunidade”. Uma música diversa é o que caracteriza este grupo que faz atuações e participa em diversos eventos que interligam diferentes comunidades. Recentemente, fizeram sucesso numa das atuações realizadas na Escola Superior de Música e Artes do Espetáculo (ESMAE), no Politécnico do Porto.
Os ensaios decorrem sempre na Sinagoga, havendo algumas exceções onde ensaiam na casa de algum elemento do grupo. A sinagoga é um sítio onde se sentem acolhidos e unidos, por isso a maior parte dos ensaios são realizados lá. “A acústica é fantástica, estar debaixo desta cúpula e temos também ligação ao legado. E somos também a voz da comunidade”.
Coro Mekor Haim (Fonte de Vida) | Imagem: Fernanda Lima
O gosto pelo canto e pela música e o orgulho de terem criado este coro são notórios por parte dos dois fundadores. A eles junta-se o maestro Leonardo Mendonça, que se ligou ao coro quando conheceu o filho de Luciano Moura e este disse que “o sonho do pai era ter um coro na comunidade". O sonho do Luciano era ter essa união musical nesta comunidade e em comunicação com o Yonah "fizeram-me o convite e acertámos horários. A altura era caótica porque começou na pandemia e faz agora três anos (começámos no início de 2020). A organização de tudo foi muito difícil, até acharmos uma forma de conseguir manter os ensaios virtualmente. Começámos por usar o Zoom e depois juntámos um outro programa, o Jamulus, e utilizámos os dois, e temos cantores de vários sítios, como Canadá e Argentina. E no fundo é isso a história, que começou devido a uma forte vontade deles os dois [Luciano e Yohan]”.
Os conteúdos musicais do coro englobam vários tipos de música “nós temos canções que são do repertório litúrgico, que são arranjadas para as adaptarmos três a quatro vozes” e “músicas populares da tradição judaica que não são, necessariamente, litúrgicas, mas têm importância para a história do povo judeu”.
O Yonah e o Luciano são considerados, por Leonardo, as enciclopédias vivas do coro, são eles que trazem as histórias e as músicas que não são só canções, como se ouve no rádio, mas “são canções que são cantadas nas liturgias: pelas mães, pelos filhos e pelos pais”. Estas são músicas que fazem parte da comunidade, seja na infância ou em outros estados do crescimento. Leonardo diz que “as músicas não trazem só a história da composição, mas também a história inserida na composição”, a música é mais que uma melodia é algo com história e memória que traz uma conexão ao povo judeu.
Atualmente, as canções que tocam são em grande parte salmos de David, o salmo 146 e o salmo 128, que são parte da oração diária e da oração do Shabat, contam também com um projeto onde introduzem algumas canções em língua Yiddish, como por exemplo Oyfn Pripetchik. Em breve pretendem apresentar à comunidade o compositor judeu italiano, Salamone Rossi, que tem uma obra vasta e importante, agora, apenas, se dedicam a intensificar o estudo e a pesquisa sobre o mesmo.
Sinagoga Kadoorie - Mekor Haim (Fonte de Vida) | Imagem: Fernanda Lima
O coro tem um papel importante na preservação da cultura judaica, seja na divulgação da cultura musical ou no destaque à comunidade, tornando-se importante dar a conhecer este gênero musical a pessoas fora da comunidade. O maestro considera que esta é uma cultura muito rica e importante, “é de facto essencial que muitas pessoas tenham acesso a esta cultura". Sente que a nível da divulgação a comunidade já faz isso de uma forma brilhante, “temos muitos eventos na comunidade em geral, não só na comunidade judaica. O repertório é de elevado valor cultural”.
Rudi Guimarães é um dos elementos mais novos a participar neste coro, juntou-se a este em setembro de 2023, depois de ter assistido a um evento da comunidade judaica, onde o coro participou. Para o jovem é “um orgulho e uma honra pertencer e fazer parte do coro", apesar de ser um dos mais recentes membros o coro já se tornou importante na sua vida. Ali criou uma família. “Somos todos amigos, é como se fosse uma grande família”.
No futuro pretende melhorar e continuar a descobrir a sua voz ao lado de “grandes mestres e pessoas que tenho grande admiração de poder conhecê-los e de conviver com eles”.
Canção Lecha Dodi | Imagem: Fernanda Lima
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